26/04/2015 - Bronze em Londres, Yane Marques fala da expectativa para os jogos da Rio-2016
Paul J Roberts / UIPM
Primeira pentatleta na América Latina e no hemisfério sul a conquistar
uma medalha em Olimpíadas, a pernambucana Yane Marques, de 31 anos,
demorou três anos – desde o bronze em Londres, em 2012 – para conseguir o
primeiro patrocínio privado.
Atleta e terceiro-sargento do Exército Brasileiro, ela corre contra o
tempo para equilibrar o nível nas cinco modalidades que pratica,
profissionalmente, desde 2003: tiro esportivo, esgrima, natação, corrida
e hipismo.
Em entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, a pernambucana
conta como ingressou no pentatlo moderno e fala sobre os maiores
desafios na carreira. Ela analisa ainda as principais adversárias no
momento e as próprias chances nos jogos olímpicos do Rio.
Um dos maiores desafios do pentatlo é manter uma curva de equilíbrio nas cinco modalidades. Você acha que conseguiu isso?
Esse é o nosso farol (foco). Ser razoável em tudo é a nossa realidade.
Brinco que a gente é muito próximo do pato, pois fazemos tudo mais ou
menos. Não nadamos como o nadador e nem montamos como uma amazona, pois o
nosso tempo dedicado a cada esporte é muito menor do que o dos atletas
que treinam em um apenas. Como vim da natação, eu tinha o nado como
ponto forte e os outros muito fracos. Mas com o tempo isso vai
equilibrando. A minha corrida foi a última a melhorar, mas estou cada
vez mais próxima desta igualdade de nível nas modalidades.
Como é a rotina de treinos para conseguir equilibrar as cinco modalidades?
Recebo o treino no domingo, e é variável por semana. São duas
equitações, quatro natações, corrida todos os dias (média de oito a 12
quilômetros por dia) e atiro todos os dias em casa. Na esgrima, tenho
dois ou três dias de jogos e algumas aulas de correção. Fora isso tem a
musculação, pilates e a fisioterapia preventiva.
Você era atleta antes de se tornar sargento do Exército? Como se interessou pelo pentatlo?
Eu sempre fiz natação, antes mesmo de ser oficial. Em 2003, foi fundada
a Federação aqui em Recife. Comecei fazendo biatlo (natação e corrida).
Fui convidada para uma competição, participei e ganhei a prova. Assim
comecei a fazer o pentatlo. Apesar de demandar muito tempo para treinar,
é uma diversidade que permite que você treine muito e não enjoe. Entrei
no exército em 2011, com a convocação para os Jogos Mundiais Militares
daquele ano.
Em 2012, em Londres, você reclamou do percurso da prova de
corrida. Para o Rio, já sabe quais as dificuldades terá de enfrentar?
Tinha subidas íngremes e ainda corríamos na grama. Foi o percurso mais
difícil da minha vida. Como a corrida é minha pior prova, quanto mais
complicado o circuito, pior para mim. Tomara que não tenhamos o mesmo
tipo de problema no Rio. Talvez o calor – apesar de eu ser nordestina –
possa ser uma das grandes dificuldades.
Outra polêmica daquele ano foi a história do cavalo, que era
velho. Como é esse processo de escolha dos equinos? Vocês não têm poder
de escolha?
Não podemos escolher. O cavalo é sorteado na hora. Os organizadores que
disponibilizam os animais. Eles são alugados. Seria muito bom se
pudéssemos ter um contato com esses animais antes, até para sabermos
algumas características deles. Facilitaria a adaptação. Muitos serão da
escola de equitação do Exército do Rio. Com certeza, vamos fazer muitos
treinamentos e vamos montar em alguns deles que estarão na prova. Espero
que possamos no beneficiar assim.
Você conquistou um pódio em Mundial (prata) após a Olimpíada.
Por que, mesmo com essa sequência vitoriosa, demorou tanto a conseguir
um patrocínio?
Esta é uma pergunta que eu não tenho muita segurança para responder.
Suponho que seja por eu praticar um esporte que é muito pouco difundido
no Brasil. Apenas Recife, Coritiba e Rio de Janeiro tem polos de
treinamento. Hoje, tenho um patrocinador (Cisco), estou muito feliz, é
um momento oportuno, e agora vou aproveitar e curtir. Demorou, mas
aconteceu.
Você conseguiu ser beneficiada pelo programa Bolsa-Pódio? A ajuda de custos é boa? Te dá condições de se preparar?
É uma ajuda muito significativa que eu e outros atletas recebemos.
Tenho me aliviado muito, ficado mais tranquila. A gente treina, mas tem o
lado psicológico que pesa muito. Sair para viajar e saber que deixo
minha família com tudo, me tranquiliza. No Bolsa, o atleta pode receber
até R$ 15 mil. Ganho um pouco mais da metade deste valor.
Você se sente prestigiada pela mídia ou acha que mesmo com a medalha de bronze em Londres não tem o devido reconhecimento?
Estou satisfeita com a mídia. Muitas pessoas me procuram para divulgar o
esporte. Aqui em Recife a procura é maior. Algumas vezes, acontece de
esbarrarmos com repórteres que fazem perguntas descabidas, por não
conhecerem o esporte, mas entendemos.
No caso do pentatlo, você tem que investir muito para se manter
no ápice. Tem uma estrutura adequada em relação às suas principais
adversárias?
Não conheço a estrutura delas. O que posso garantir é que a minha é
satisfatória. Desde 2010 eu passei a integrar o Time Brasil, do Comitê
Olímpico Brasileiro (COB), e em 2011, ingressando no Exército, tenho
todas as condições para me preparar. Além disso, algumas estruturas
particulares que usamos também só merecem elogios. Arrisco dizer que
muitos atletas no país não têm o que eu tenho aqui.
A lituana Laura Asadauskaite e a polonesa Oktawia Nowacka são ainda as suas principais rivais?
A Laura (Asadauskaite) é a mais constante do esporte hoje. Ela oscila
muito pouco e desmistifica a história do atleta de pentatlo não repetir
pódio. Na última prova (na Copa do Mundo de Roma), ela partiu em 20º
lugar e terminou em primeiro. Já a Nowacka oscila muito. No Egito ela
não se classificou para a final. No entanto, quando ela está num dia
bom, também é uma grande rival. Existem chinesas, alemãs, italianas e
inglesas muito fortes também. Tenho umas 15 rivais de peso sempre. Em
Londres foi assim.
O COB já havia te colocado na “conta” das medalhas para 2016.
Ao mesmo tempo que traz um reconhecimento, essa decisão tem uma certa
carga de pressão. Isso atrapalha? Consegue filtrar?
Vejo sempre o lado bom das coisas. Quando a pressão existe, é porque
você é capaz de realizar aquela tarefa. Ninguém mais do que eu quer esta
medalha de ouro.
Como está a preparação para os jogos olímpicos? Como se vê no
momento? E se os jogos do Rio começassem amanhã, você estaria preparada?
Ainda tenho muitas coisas para melhorar. Atualmente, penso na minha
classificação, que só começa a partir de junho, no Pan-americano – em
Toronto, no Canadá. Se isso acontecer, aí sim farei um trabalho
exclusivo apenas para os jogos. Se eu não conseguir, terei que me
preparar para outras competições, que também dão vaga.
Você tem pesadelos com contusões?
Não. Tive poucas lesões na carreira e o trabalho preventivo que faço me deixa segura.
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